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Artigos / Rosana Leite Antunes de Barros

09/11/2022 | 07:38

​Cecília Meireles: efêmera e eterna

Nascida Cecília Benevides de Carvalho Meireles, em 07 de novembro de 1901, no Rio de Janeiro, foi a primeira mulher brasileira a marcar espaço na literatura. Jornalista, poeta, professora, tradutora e pintora, recebera o inicial prêmio literário a marcar a carreira aos 8 anos de idade. 

 

Apesar de não se intitular feminista, lutou arduamente em prol dos direitos humanos das mulheres, discordando do termo poetisa a designar as mulheres a escrever poesias.

 

Na concepção dela, o verbete ‘poetisa’ se perfazia em diminuição do trabalho, dando a entender se cuidar de ‘mulher prendada’. Se a palavra poeta já se perfaz em vocábulo comum para os dois gêneros, sendo até mesmo uma palavra feminina, não há motivo para a flexibilização para se distinguir pessoas a escrever poesias em sendo do gênero masculino ou feminino.

 

Para marcar o seu posicionamento, deixou o registro no poema intitulado ‘Motivo’: “Eu canto porque o instante existe/ E a minha vida está completa/ Não alegre e nem sou triste: sou poeta.”

A escritora teve como marcas a melancolia, a fuga da realidade, e elementos sensoriais como: amor, misticismo, espiritualismo, solidão, saudade, religião e morte.

 

Não se filiando a nenhuma escola literária, apenas às tradições da lírica luso-brasileira, Cecília teve muito contato com a morte de pessoas importantes da família, que marcaram a sua escrita.

 

O pai falecera três meses antes do seu nascimento, e a mãe antes que ela completasse três anos. Ainda, um de seus companheiros veio a cometer suicídio. Inclusive, para se tornar mais “leve”, por conselho de um médium desconhecido, resolveu retirar um dos eles de seu sobrenome, logo após a morte do companheiro.

 

As letras a realizavam como bálsamo, em uma mistura de desabafo e concretização.  Das Palavras Aéreas: “Ai, palavras, ai, palavras,/ que estranha potência, a vossa!/ Ai, palavras, ai, palavras,/ sois de vento, ides no vento,/ no vento que não retorna,/ e, em tão rápida existência,/ tudo se forma e transforma!”

Com mais de 50 obras publicadas, deixou importantes contribuições como contista, cronista, folclorista, e para a literatura infantil. Foi responsável pela fundação, no ano de 1934, da primeira biblioteca infantil no Rio de Janeiro, que foi fechada no ano de 1937, após denúncias de que no local haveriam obras de conteúdo duvidoso, já que no espaço um dos livros para estudo era o clássico de Mark Twain denominado “As aventuras de Tom Sawyer”, que retrata as traquinagens de uma criança esperta. Buscou, de forma enfática, pela laicidade e pelo ensino de qualidade.

 

Trouxe na filosofia a reflexão. Não se deixou ao tempo de curtir solidão, desespero e tristeza, pela história de vida. Decidiu pela poesia, para marcar a efemeridade e a eternidade. Em ‘Motivo da Rosa’ existe essa tão importante marca: “Vejo-te em seda e nácar,/ e tão de orvalho trêmula,/ que penso ver, efêmera,/ toda a beleza em lágrimas/ por ser bela e ser frágil.”

 

Cecília, como crítica sociopolítico de sua época, não ficou calada diante dos movimentos ultranacionalistas como o fascismo e o nazismo. Elucubrou sobre o conflito existencial e espiritual que ecoava com a Segunda Guerra Mundial. Na verve de poeta, fez uso de versos regulares e livres.

 

Na atualidade tem se falado sobremaneira quanto ao mundo ser cíclico. Quem sabe, seja mesmo...

 

O enfrentamento é para que dissabores de outrora sejam espancados, tendo nos direitos humanos o pilar da grande proteção. Aliás, a obra da escritora mais apreciada pela crítica é “Romanceiro da Inconfidência”, que parece ter sido escrita por esses dias: “Atrás de portas fechadas/ à luz de velas acesas/ entre o sigilo e a espionagem/ acontece a Inconfidência/ E diz o vigário ao poeta:/ “Escreva-me aquela letra/ do versinho do Virgílio...”/ E dá-lhe o papel e a pena./ E diz o poeta ao vigário,/ com dramática prudência:/ “Tenha meus dedos cortados,/ antes que tal verso escrevam...”/ Liberdade, ainda que tarde.”
Rosana Leite Antunes de Barros

Rosana Leite Antunes de Barros

Defensora Pública Estadual
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