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Notícias / Cidades

26/03/2020 | 08:07

Isolar apenas idosos não é suficiente para combater coronavírus, dizem cientistas

Redação TV Mais News

Especialistas consultados pelo GLOBO sobre a proposta de relaxar as medidas de isolamento da Covid-19 no Brasil como 'genocídio' e 'irresponsabilidade' para descrever o que poderia aconteceria com os idosos, mas não foram unânimes em criticar o presidente Bolsonaro. Ao menos um cientista que tem sido consultado para a política de resposta á Covid-19 diz que não vê risco de o presidente interferir no desenho da reação à epidemia.

Os pesquisadores foram ouvidos após o presidente Jair Bolsonarosugerir em pronunciamento na noite da última terça-feira que apenas idosos sejam objeto da estratégia de distanciamento social, mas que jovens adultos voltem ao trabalho e escolas sejam reabertas.

Todos criticaram a proposta de isolamento "vertical" (só para um grupo específico), sobretudo em se tratando dos idosos, que precisam de ajuda para levar a vida e não podem se apartar totalmente da sociedade. Quando o vírus se espalha mais rápido no resto da população, afirmam, ele chega nos idosos mais rápido.

Críticas a Bolsonaro
Luciana Costa, professora de virologia da Instituto de Microbiologia da UFRJ, qualificou de "irresponsabilidade" a sugestão do presidente para que se relaxe as medidas de isolamento para população jovem e adulta.

— É irresponsável isso que está sendo feito pelo representante máximo de uma nação. A não ser que a gente isole totalmente idosos do convívio com qualquer pessoa que esteja circulando com o adultos e crianças, não é possível garantir que o vírus não vai chegar até eles — afirma a cientista. — Existem muitas famílias em que o idoso mora numa casa com crianças e e adultos, em espaços pequenos, principalmente nos extratos menos favorecidos da população.

Segundo a pesquisadora, mesmo em países que inicialmente consideraram isolamento social seletivo para idosos, como o Reino Unido, epidemiologistas já convenceram o governo que as medidas de distanciamento social precisam ser mais amplas.

— Evidentemente, nós entedemos que essas medidas têm impacto relevante na economia. A questão é definir o que é mais importante agora: evitar o numero de baixas na população e o problema social que tudo isso causa, evitar um problema de saúde pública que pode ser catastrófico.

Entre os infectologistas são muitos também aqueles com mensagens mais enfáticas contra o pronunciamento da noite da última terça-feira feito pelo presidente da República.

Tânia Vergara, presidente da Sociedade de Infectologia do Estado do Rio de Janeiro, diz que considera "indispensável" manter a atual política de isolamento.

— As maiores autoridades em epidemiologia e infectologia, não só do Brasil, mas do mundo, não estariam fazendo uma recomendação com um custo econômico e social enormes se não fosse absolutamente indispensável no momento — afirmou ao GLOBO.

 Sua entidade subscreve a nota emitida na quarta pela Sociedade Brasileira de Infectologia: "Quando a Covid-19 chega à fase de franca disseminação comunitária, a maior restrição social, com fechamento do comércio e da indústria não essencial, além de não permitir aglomerações humanas, se impõe. Por isso, ela está sendo tomada em países europeus desenvolvidos e nos Estados Unidos da América", afirma nota da Sociedade Brasileira de Infectologia.

A infectologista, que está no grupo de risco e relata estar se expondo para atender alguns pacientes, afirma que é importante que quem puder ficar em casa permaneça isolado, para não ficar doente e para evitar contribuir com a rápida disseminação do vírus.

Paolo Zanotto, virologista do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, comentou a proposta de devolver pessoas mais jovens ao mercado de trabalho, mas disse que não queria responder diretamente à declaração do presidente Bolsonaro.

— Eu sou cientista, e minha opinião política é irrelevante — afirmou o pesuqisador, que criticou a imprensa e disse ver na polarização política um problema que pode agravar a crise da Covid-19.

Foco errado
Para o professor da USP, é possível devolver parte do contingente da força de trabalho ao dia-a-dia, mas a medida tem de ser feita com base em testagem de pessoas para saber se já foram infectados, passaram do período de convalescência e já estão imunes.

— Se a gente não testa as pessoas antes de dizer que podem voltar ao trabalho, à escola, estamos simplesmente adensando a população de novo e jogando lenha na fogueira. Não é inteligente — afirmou.

Zanotto disse, porém, que o excesso de foco e de preocupação com declarações do presidente Bolsonaro é equivocado.

— Não adianta colocar o foco na pessoa errada, porque não é ele que vai definir isso — disse Zanotto. — O que o ministro Mandetta está fazendo é inacreditavelmente bem feito, e eu sei que ele e o Wanderson Oliveira (secretário de Vigilância em Saúde) estão preparando isso de maneira cuidadosa. Um documento da vigilância sanitária está na mão dos cientistas para ajudar a construir isso.

Um dos especialistas com palavras mais duras para Bolsonaro foi Alexandre Kalache, epdimeiologista do Centro Internacional de Longevidade e ex-diretor do programa de envelhecimento da OMS (Organização Mundial da Saúde)

Para ele, relaxar medidas de isolamento agora seria um ato de "genocídio" contra os idosos. Ele disse ter se espantado com a sugestão do presidente.

—- É assustador. O que está sendo feito é um genocídio relacionado à idade — afirmou Kalache. — Não basta os idosos estarem isolados se outros membros da família, crianças ou adultos mais jovens, trouxerem o vírus para dentro de casa e continuarem espalhando o vírus nas ruas.

-- O isolamento social de toda a população tem uma função fundamental — afirma. — O grupo de alto risco para complicações da Covid-19 é o que tem doenças crônicas, que pode ser de qualquer idade, ou aquele que além de ter doenças crônicas tem mais de 60 anos de idade e uma resposta imune baixa. Se essas pessoas forem infectadas, elas vão apresentar as complicações que vão levar ao colapso do sistema de saúde.

Como uma parcela muito grande da população idosa do país vive em condições sociais de pobreza e privação, mesmo com uma população em média mais jovem que a da Itália, temem-se cenas aqui como o encontro de idosos mortos em casa, como se viu na Espanha, e mortalidade em massa como se viu na Itália e no Irã.

— O que se exige no momento é um pacto social para proteger a população mais vulnerável — diz Kalache.

Fonte: O Globo

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